"...Ele observava principalmente os rostos nas arquibancadas - a decepção e o cansaço resignado que se liam em suas fisionomias davam a impressão de que os torcedores sofriam mais com a derrota do que os próprios jogadores na cabine. E talvez assim fosse. Dave imaginou que para alguns deles aquele era o único jogo a que assistiriam naquele ano. Tinham trazido os filhos, a mulher, tinham saído de suas casas, internando-se na noite californiana, carregados de caixas de isopor para o piquenique no estacionamento. Tinham comprado cinco ingressos baratos que, embora não garantissem uma boa visão do jogo, pelo menos lhes poupavam dinheiro para cobrir a cabeça das crianças com bonés de vinte e cinco dólares, comer sanduíches de seis dólares e cachorros-quentes de quatro dólares e cinqüenta, tomar Pepsi aguada e picolés grudentos que se derretiam e lhes sujavam os pêlos dos punhos. Tinham vindo para se sentir animados, exaltados - Dave o sabia - para se sentir transportados para fora de sua existência pelo raro espetáculo da vitória. Razão pela qual as arenas e os estádios de beisebol sempre lembravam catedrais feericamente iluminadas, preces murmuradas e o batimento de quarenta mil corações unidos pela mesma esperança coletiva.
Ganhem por mim, rapazes. Ganhem por meus filhos. Ganhem por meu casamento, para que eu possa levar no carro o seu triunfo, inebriar-me dele com minha família quando estivermos voltando a nossas vidas sem glória.
Ganhem por mim. Ganhem. Ganhem. Ganhem.
Mas quando a equipe perdia, essa esperança coletiva se esfacelava, e com ela toda a ilusão de união partilhada com outros fiéis. Seu time o traiu, o que servia apenas para lembrá-lo de que você sempre perdia quando tentava alguma coisa. Que seus sonhos sempre davam em nada. Então você ficava ali sentado, entre os restos da embalagem de celofane, os restos de pipoca e copos de papel encharcados, a contemplar uma vez mais o naufrágio de sua existência, tendo pela frente a perspectiva de uma longa marcha sinistra, por um estacionamento sinistro, entre hordas de estranhos bêbados e furiosos, em companhia de três crianças emburradas e de uma esposa silenciosa, fazendo as contas de suas derrotas. E tudo isso para finalmente chegar em casa, o próprio lugar de onde aquela catedral prometera tirá-los."
Sobre Meninos e Lobos
"Mystic River"
Dennis Lehane
Companhia das Letras
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